Que o Kiyoshi Kurosawa é um mestre das tensões e um gênio estilístico, não se nega mais. Porém, achei que, aqui, o exercício muito bem realizado se esvai antes que a proposta seja direcionada a um encaminhamento tramático propriamente dito: pareceu-me apenas um 'trailer', uma publicidade estendida que não deixa claro o que está sendo efetivamente vendido: autoralidade per si? Seja como for, é um trabalho muito bem interpretado, com excelente fotografia e desenho de som, momentos assustadores e perturbadores e muitas pistas falsas (o empréstimo solicitado pelo filho e a obsessão da esposa pelas latas de refrigerantes, à frente). Amei e me inspirei na paciência docente do protagonista, sobremaneira indulgente em relação aos pantins de seus alunos culinários. Até certo ponto, entretanto... Tecnicamente irrepreensível, mas enredisticamente pendente. Seria intencional? Talvez eu ame o filme numa revisão ou numa retrospectiva/maratona da carreira do cineasta, mas, neste primeiro contato, o média-metragem não funcionou tanto comigo, infelizmente! (WPC>)
Primeiro questionamento: por que o diretor, responsável por obras tão originais, em oportunidades anteriores, resolveu render-se a um filme tão convencional, formulaico e atravessado pelas piores convenções familiares? Graças aos créditos de encerramento, sabemos que ele é parente de um humorista muito famoso no Ceará, que serviu de inspiração para o protagonista. Porém, isso não é suficiente para justificar o cabedal de equívocos aqui deslanchado: durante a projeção, sento muita vergonha alheia. Fazia tempo que eu não ficava tão incomodado durante uma sessão, por causa das interpretações retraídas, artificiais... Felizmente para o meu relacionamento com o filme, notei que isso tem a ver com a diegese, já que é uma narrativa sobre as tentativas de pertencer em ambientes de aparente repulsa/expelição inicial. O personagem de Démick Lopes comete erros o tempo inteiro e segue equivocado em sua impercepção de alguns deles (o desfecho, em sua forçação de barra melodramática, é vexatório!), mas isso também tem a ver com um subtexto tramático, de maneira que o filme, em seus equívocos, assume os erros dos personagens e, tanto um como os outros merecem novas chances e o nosso apoio espectatorial. Jesuíta Barbosa aparece como mero chamariz de público, mas demora a demonstrar-se orgânico, em relação ao que ocorre ao redor dele. Amei a trilha musical, repleta de artistas alternativos, e, em meu incômodo extremo, flagrei-me pensando em minha própria vida, em minhas escolhas, em meus anseios e frustrações. E, mais uma vez, o filme é sobre tudo isso. Funciona, portanto. Principalmente quando é permitido algum respiro circunstancial, para além das cenas de pretenso impacto, ostensivamente falhas (o que ocorre na discussão da praia e no hospital é lamentável, de tão mal executado. Idem para o surgimento da mãe, em determinado momento). A sessão terminou há algumas horas, mas sigo pensando no filme, com um carinho maior que as minhas irritações. Até deu vontade de revê-lo, devidamente acompanhado. Sigo crente no diretor, ressalto. Mas realmente torço para que ele se afaste dessas narrativas mais tradicionais (nos dois sentidos do termo, incluindo o pior deles). Sigamos! (WPC>)
Estranhamente, eu não conhecia esta dupla genial de realizadores - e, em meu primeiro contato tardio, fui arrebatado, fiquei apaixonado: os números de dança são magníficos, as autocitações são ótimas, a reverência a Jacques Tati, Aki Kaurismäki e Roy Andersson é evidente, e o modo como a trama se desvela é magistral, inclusive no que tange às questões políticas (vide as oportunas menções a greves, por exemplo). Amei a trilha musical (Birds on a Wire, já sou fã de vocês!) e Kaori Ito merece ser aplaudida de pé: que mulher impressionante! Filmaço, gente. Não desperdicem a oportunidade de conferi-lo: quero tirar o atraso quanto aos trabalhos prévios dos realizadores, o quanto antes! (WPC>)
Não sabia direito o que esperar: gostei muito do título e percebi que muitos amigos tinham apreciado, de modo que já tinha o interesse suficientemente despertado. Ainda não vi o longa-metragem anterior da diretora, mas, pelo que percebi aqui, ela domina com profusão as convenções do gênero. Os admiradores de David Cronenberg e Julia Ducournau devem ter ficado muito felizes com os resultados, bem como os fãs de Nicolas Winding Refn, com quem o estilo da diretora é deveras assemelhado. Ed Harris e Jena Malone estão ótimos em papéis intencionalmente caricaturais, mas as grandes interpretações são as das duas protagonistas, tão opostas e complementares como Yin e Yang: que Kristen Stewart é uma ótima atriz, todos nós já sabemos, mas não conhecia Katy O'Brian, fiquei impressionado com a sua ótima presença em cena, com a sutileza de suas transformações (emocionais, não apenas explicitamente corporais). A trilha musical sintetizada de Clint Mansell é ótima, bem como a utilização de múltiplos tons rubros na fotografia. Causa algum estranhamento o fato de quase tudo naquela cidade ter a ver com três ou quatro personagens (neste sentido, o filme possui uma aparência obliquamente teatral similar à de KILLER JOE - MATADOR DE ALUGUEL), mas é um aspecto que não atrapalha os ótimos efeitos cinematográficos: o que ocorre naquele surpreendente e alucinógeno desfecho é acachapante. A-do-rei! (WPC>)
Como estou assistindo aos filmes desta diretora em ordem cronológica invertida, está havendo também a constatação de uma ordem decrescente de qualidade. O que não chega a ser demeritório, visto que seu domínio do roteiro com múltiplas camas e do elenco impressionam a cada novo contato. A envergadura assumidamente cômica desta obra possui um cariz auto-indulgente, o que talvez explique o porquê de ele não ter me fisgado tanto quanto os dois longas-metragens posteriores: é como se, ao explicar que beleza e inteligência são critérios que chamam a atenção do júri, a protagonista me fizesse suspeitar do meu fascínio pelas situações amorais trazidas à tona. A personagem é ótima, as situações são sempre críveis, as aparições animais são magistrais e o desfecho é conciliador, afinal, mas , no saldo geral, senti falta das pontas soltas que tornar-se-ão o grande apanágio do estilo trietiano. Incrível como, numa obra ainda curta, ela já conseguiu se consolidar autoralmente: nasceu pronta! (WPC>)
Há muito nas entrelinhas do roteiro: como a protagonista é uma leitora compulsiva, ela nos treina para que leiamos também. Neste sentido, faz sentido que tantos espectadores tenham notado reverberações de romances famosos, além das próprias discussões internas sobre "Os Irmãos Karamazov". Gostei de como a ambientação político-nacional reflete a pós-adolescência da personagem, mas, depois de certo momento, começou a ficar repetitiva e não mais tão interessante o ciclo de atração e repulsa entre a jovem e o vizinho mais velho de seu namorado. A fotografia perenemente alaranjada fascina, também, pelos subtextos comparativos, já que faz o trigo rimar com o crepúsculo, com os cabelos loiros da protagonista e com o papel de parede do quarto de Henner. Começar com Depeche Mode e terminar com Patti Smith foi uma ótima sacada da diretora. Mas o filme estendeu-se onde talvez nem precisasse e subestimou o potencial reflexivo das conversas familiares, das múltiplas distinções (cidade x campo, RDA X RFA, etc.) que atravessam a trama... Seja como for, possui calor, que eventualmente redunda em febre. É agradável, ajuda-nos a refazer as pazes com memórias de juventude. E estimula-nos a voltar aos clássicos da Literatura mundial! (WPC>)
Que o Murilo Benício é um ótimo e versátil ator, não se nega. Mas, como diretor, infelizmente, está optando pelas execuções mais equivocadas possíveis. Aqui, por exemplo, a indefinição do ritmo cômico faz com que o filme pareça um pasticho mui piorado de MINHA MÃE É UMA PEÇA - O FILME, sem o mesmo talento na composição de personagens: é tudo exageradamente caricato, insuportável de ser acompanhado. A montagem alinear é horrenda, a concepção do álter-ego do dramaturgo é péssima (que atorzinho inexpressivo!) e a pretensa homenagem à maternidade é tolhida no próprio projeto, pela maneira abjeta e oportunista com que a personagem-título trata a mãe, que sequer aparece... É um retrato cômico (mas sem graça) sobre os estereótipos de classe e sobre os apanágios egoístas e egocêntricos dessa conjuntura. Não se consegue entender adequadamente os conflitos de personagens secundários (a traição conjugal perpetrada por uma das tias, por exemplo), de tão mal desenvolvidos que estes são. E o narrador revela-se alguém progressivamente desinteressante e mui desagradável: não conheço a origem teatral desta produção, mas, por este roteiro, é difícil imaginar que ele tenha se convertido num autor tão consagrado. Esforcei-me para gostar de algo no filme, mas é tudo degringolado, histriônico, disfuncional... Uma pena! (WPC>)
Foi o meu primeiro contato com o diretor, e já fiquei sumamente apaixonado: por mais que a sinopse direcione-nos para uma determinada trama, o que se descortina diante de nossos olhos (e, sobretudo, ouvidos) é extremamente radical, múltiplo, polifônico. A montagem de sons desta obra é uma das coisas mais geniais que existem! Vi o filme com minha mãe, que temeu ficar tonta, tamanha a quantidade de 'travellings' circulares, tão longos quanto brilhantes. Confirmando a associação do Cinema Marginal (ou melhor, pós-Novo, como bem dizia o Carlos Reichenbach) às estradas vazias, aqui, elas abundam: a migração ocorre da cidade grande para o interior, num percurso que faz completo sentido, em relação às intenções do diretor, que é mineiro. Não o conhecia: descobri esta obra-prima por conta de seu falecimento, e fiquei alucinado. Pereio está gostosíssimo como personagem maladro. Minha mãe ficou espantada com a quantidade de livros nos cômodos. Tudo aqui é genial: Maria Gladys deve ter ficado felicíssima com a menção nos ótimos e mui coloridos créditos de abertura. Um novo mundo abriu-se para mim, em pleno Brasil. Ôba! (WPC>)
Que filmaço é esse?! Como é que eu pude ficar tanto tempo sem conhecê-lo?! A cada obra do Kiyoshi que eu descubro, fico mais e mais impressionado com a maneira como ele mescla as convenções de diversos gêneros. Porém, o que ele faz aqui é ainda mais acachapante: pense num filme surpreendente, com as reviravoltas mais impensáveis... O elenco é ótimo e a direção entrega-nos seqüências longas e impressionantes (vide o que ocorre no hospital). O mote de invasão alienígena é pretexto para valiosas reflexões sobre relações humanas, incluindo uma crise marital e um contexto empregatício mui abusivo. Os efeitos visuais são magistrais, bem como a maneira esplêndida com que os "possuídos" pronunciam, de maneira intencionalmente inexpressiva, elucubrações existenciais de alto calibre. Magnífica descoberta, fui arrebatado! (WPC>)
Não sou muito aficcionado por gatos, de modo que apreciei de imediato o ponto de partida tramático, afinal dividido em três episódios: é incrível como os felinos estão associados ao terror, né? O segmento que intersecciona os episódios é um tanto exagerado, no que tange à exigência de verossimilhança para os relatos literários trazidos pelo personagem de Peter Cushing, mas é divertido vê-lo interagindo com Ray Milland. O primeiro episódio, mais aterrorizante efetivamente foi o meu favorito. O segundo é um interessante conto de perversão infantil. E o terceiro adere a uma perspectiva mais cômica. Cada um dos três possui o seu charme peculiar. Um passatempo divertido! (WPC>)
Revi com minha mãe, a propósito convidativo de um debate em cineclube, e foi ótimo vê-la torcer pelos mocinhos/bandidos (leia-se: anti-heróis): por mais radicalmente anti-armamentista que minha mãe seja, em diversos momentos ela queria que os personagens matassem seus perseguidores, de tão entusiasmada que ela ficou. Há inúmeras possibilidades de interpretação freudiana para as situações do filme, com destaque para aquela abertura explícita e magistral. A voz de Peggy Cummins é sumamente sedutora: que mulher linda, como não se apaixonar imediatamente por ela? Trata-se de um filme pioneiro e mui subversivo, que aborda as questões fetichistas de maneira originalíssima e enfatizando a complementaridade requerida por determinadas ações, sobremaneira quando de ordem criminosa. A seqüência final - idílica e desoladora, ao mesmo tempo - é excelente. Em minha opinião empolgada, uma obra-prima absoluta! (WPC>)
Ouvi tanta gente falando mal, que adentrei a sessão sem quase nenhuma expectativa. Mas, tanto como ocorreu em ENCANTO, fui logo atraído pelas belas canções com acento hispânico. Havia algo de promissor na narrativa, que atualizava questões tanto do Velho Testamento quanto de MILAGRE EM MILÃO, no que tange a livre-arbítrio e questões afins. Mas, de repente, tudo se perde numa narrativa insossa, sem desejo ou paixão, tão artificial que parece uma mera costura forçada para acrescentar as auto-referências a inúmeros outros longas-metragens clássicos da Disney. Será que o roteiro foi escrito com o auxílio de Inteligência Artificial? É o que parece! Tanto que a reviravolta não convence muito, além de eu ter achado o personagem do bodinho falante (com voz grave) inconveniente e destoante. Os momentos isolados de candura compensam o saldo geral entretanto: minha mãe, por exemplo, adorou! (WPC>)
Este filme marcou a minha pré-adolescência: foi a primeira vez na vida em que ouvi a palavra "orgasmo" e que apresentou-me a uma artista que, naquela época, já era completa, já podai ser considerada imortal. após o show arrebatador do último sábado, no Brasil, resolvi voltar a este documentário seminal, e percebi muitas similaridades cênicas. Os depoimentos são ótimos, bem como a demonstração das vocações maternais da cantora, que tratava a seus dançarinos como filhos. Ela não hesita em se exibir como caprichosa, mimada e um tanto infantil nalguns momentos, mas tudo isso é justificado pelas diversas falas sobre a necessidade de ser amada. As situações envolvendo os seus familiares, no show em Detroit, também explicam muito sobre ele. Idem quanto aos encontros com Kevin Costner, Pedro Almodóvar, Antonio Banderas e o relacionamento com Warren Beatty. A despeito da longa duração, é um filme muito gostoso de ser visto, principalmente quando se é fã da estrela titular. Muito bom perceber quão fiel a si mesma ela permaneceu, trinta e três anos depois que ela própria tinha ainda 33 anos. Adorei! (WPC>)
Em uma nova revisão, com debate, alguns problemas, maiores que as próprias contradições estruturais, se manifestam: o desfecho imposto por David Cardoso, por exemplo, que contradiz a lógica anterior do enfrentamento entre os personagens. No geral, entretanto, a autoralidade candeiasiana e a base teatral validam a narrativa muito forte sobre um período atroz de nossa história. O personagem masculino é bem construído em sua ojeriza e Vera Gimenez consegue se impor como freira descobrindo que amar a Deus requer prática. O uso da trilha musical, a montagem elíptica e a fotografia do próprio Candeias são agrados à parte, bem como a averiguação das obsessões bestiais do realizador, que sempre expõe como as agruras do ambiente tendem a desumanizar os indivíduos. Incômodo e problemático, mas indubitavelmente ótimo! (WPC>)
Vários amigos acham este o melhor da trilogia. Eu, entretanto, sempre tive uma barreira íntima em relação a ele. Na revisão, acho que entendi o porquê, em lógica de psicologia reversa, visto que vermelho é a minha cor favorita, sou extremamente cinófilo e também passo por questões envolvendo a renúncia de compromissos pessoais em razão de problemas familiares. Zbigniew Preisner comparece com um lindo bolero (executado numa passarela de moda, quem diria?) e Iréne Jacob encanta-nos a cada instante, a cada sorriso, a cada emulação profissional de tristeza... A direção e a montagem são sobremaneira joviais e a personificação de Jean-Louis Trintignant faz jus à sua fama enquanto ícone francês. O vermelho fascina, seduz... As indicações ao Oscar que o filme recebeu são merecedíssimas! Imagino o impacto desta obra para o jovem Paul Thomas Anderson, por exemplo. Lindo: na revisão, emocionei-me bastante! (WPC>)
O tom dramático muda em relação ao primeiro filme: aqui, o diretor retorna à condição polonesa, em contraste com o idílio francês, prometido via matrimônio com uma das mulheres mais lindas existentes: apaixonei-me perdidamente por Julie Delpy desde o primeiro instante. Sua personagem é cruel, entretanto: ferida em seu desejo feminino, ela é pivô de uma trama de vingança que, em muitos aspectos, soa alegórica. O tango preisneriano é belíssimo, e a amizade edificada naquela corrida na neve marcou a minha pós-adolescência! É o menos favorito da trilogia, mas, ainda assim, brilhante em diversos aspectos! (WPC>)
Depois de assistir a este filme N vezes em minha adolescência (obrigado, revista Caras!), o revi após mais de 20 anos - e foi uma experiência epifânica , tanto como são muitas das situações que ocorrem no enredo: parte-se de uma tragédia, de um evento muito doloroso, rumo à potência da reconciliação, com uma sinfonia enquanto metáfora. Juliette Binoche está em estado de graça, e a trilha musical de Zbigniew Preisner é antológica, clássica desde o momento de sua composição. Que fotografia sublime: sempre que aparecia um relance de azul, eu comemorava, eu exultava. Mas há estratagemas ainda mais complexos e sutis envolvendo cores, como aqueles apagões de hesitação, em momentos decisivos. os coadjuvantes são ótimos (até Emmanuelle Riva comparece) e as situações paralelas e/ou secundárias são igualmente contributivas para a libertação da protagonista, em sua renúncia inicial ao luto. Obra-prima absoluta: soberbo! (WPC>)
De fato, quando Dercy Gonçalves está em cena, o filme consegue provocar o riso por conta de seus exageros. Mas o que ela faz com um cavalo e seu condutor, no terço final, é indefensável: minha mãe ficou irritadíssima, inclusive porque ela sequer paga ao figurante, que fica inerte enquanto as situações previsíveis de resolução acontecem. O casal jovem é canastrão e as crianças são graciosas. E, por mais que as apresentações da escola de samba soem um tanto arrítmicas, no modo como invadem a narrativa e se demoram - desencadeando um desfecho anticlimático para o filme -, elas comprovam o zelo do diretor em relação à trilha musical. É uma produção que, em suas convenções chanchadescas tardias, envelheceu mal. Mas que, ainda assim, diverte e faz com que prestemos atenção ao seu realizador, infelizmente pouco valorizado pelos enciclopedistas cinéfilos. De minha parte, estou esforçando-me para corrigir isso! (WPC>)
Apesar do título suspeitoso e execrável, o file é bem mais elaborado do que a publicidade fez parecer: o enredo, em sua brasilização de O CÉU PODE ESPERAR e afins, proporciona boas interpretações ao elenco envolvido e um aproveitamento elaborado de personagens lúbricos históricos. Sandra Barsotti, colaboradora habitual do diretor, está contida, enquanto Maria Lúcia Dahl arrebenta como uma feminista assumida e ostensiva. Quem acreditaria no Ney Latorraca enquanto conquistador heterossexual? (risos) Grande Otelo, apenas por aparecer, já nos provoca risos legítimos. E o cuidado do cineasta com a trilha musical (ótimo o tema próprio, inclusive) é mui laudatória. As seqüências que mostram a infância dos gêmeos evidencia um freudianismo extraordinário. Não gostei tanto quanto poderia gostar, mas achei o projeto inteligente e merecedor de novas chances. De uma hora para outra, estou recomendando para todo mundo um diretor que eu não conhecia - e que, infelizmente, partiu muito cedo, tendo realizado pouquíssimos filmes! (WPC>)
Surpreendentemente, apesar de eu ter pesquisado as pornochanchadas em meu Mestrado, eu não conhecia o Saul Lachtermacher até um dia desses. E, sem ter visto os filmes, cri que ele fosse medíocre por causa de seus títulos super machistas. Erro meu! A despeito do ponto de partida machista, inevitavelmente, o roteiro torna o protagonista legitimamente defensável (por ele não ser ciumento, por exemplo). O modo como os adultérios são justificados (mediante concessão psicanalítica) é interessante e a revelação da "maldição" impotente é hábil e divertido. Minha mãe gargalhou em diversas cenas e eu fiquei realmente espantado com a guinada ideológica que o filme dá: a partir da mais repetitiva das situações, faz com que percebamos que há um problema nisso (vide as conversas do ciclo feminino, desde a despedida de solteiro). Quem diria? (WPC>)
Fiquei muito interessado por este filme desde que soube de seu lançamento: amo musicais e sou apaixonado por música brega. E acho a Raffaella Carrà belíssima, obviamente. Como tal, é claro que eu interessar-me-ia por um a homenagem a ela. E, de fato, curti o começo efusivo e o modo como, gradualmente, em meio ao desenvolvimento da comédia romântica, passa-se a abordar a questão da censura durante uma ditadura militar. O que poderia alavancar o filme serviu para atrapalhá-lo, no sentido de que, no terço final, o roteiro rende-se a uma indulgência excessiva em relação a personagens moralistas e sumamente vilanescos, que são recompensados por terem feito o pior, uma pena. Tantos finais diferentes (e melhores) foram anunciados... Por motivos óbvios, lembramos de MMA MIA! - O FILME, mas o alinhavamento cancional é superior aqui, além de as canções serem mais respeitadas. Vi com minha mãe, foi divertido, ao menos! (WPC>)
Apesar do título amplo e diagnosticador, a reflexão nacional possui um viés íntimo e familiar: o que interessa ao diretor não é realizar um tratado sobre a pornochanchada, como parecia, mas uma abordagem pessoal, semi-ensaística, acerca de sua relação com os filmes do pai diretor, Saul Lachtermacher, que eu bizarramente não conhecia, apesar de ser atraído pelo tema de suas obras. Já descobri que, dentre os quatro longas-metragens deste diretor, ao menos três estão atualmente disponíveis, na internet. Compensarei esse atraso urgentemente, enquanto aguardo novas sessões do derradeiro filme, considerado perdido por muito tempo. Pessoalmente, até gostei da narração do Adolfo, mas incomodei-me com o excesso de de imagens de três filmes, exageradamente mostrados, o que atrapalha o prazer de quem ainda não os viu ou soa redundante para quem já os conhece. Achei oportuno que a consciência do machismo estrutural naqueles enredos fosse reconhecida e criticada , mas não rejeitada por completo, visto que, a despeito disso, alguns dos filmes maculados por esta pecha ignóbil têm algo de interessante em seu bojo. É o que verificarei a partir da filmografia do Saul... Voltarei a este assunto: aguardem-me! (WPC>)
Numa oportunidade anterior, o diretor deste documentário adaptou muito bem uma obra do escritor: acho O CLUBE DOS ANJOS um filme interessantíssimo. Mas não entendi bem o recorte temporal escolhido para este documentário camerístico, intimista quanto o autor se declara: filmado em 2016, às véspera do aniversário de 80 anos do personagem-título, há uma contagem repressiva para a data-chave. Mas, exceto por esta relevante comemoração, por que escolher este período? Não há justificativa para tal e, apesar do ritmo lento - que, repito, combina com as declarações de introspeção do escritor - pouco é mostrado, não se sabe muita coisa sobre ele, exceto que ele é amado pela família e que movimenta-se com dificuldade, por conta da idade avançada. E daí? Temos um importantíssimo escritor em cena, e o diretor realiza um elogio à monogamia bem sucedida? Tem seus méritos, claro, mas decepciona bastante em relação ao biografado. (WPC>)
Não conhecia esta diretora e, num filme quiçá hiperestimado pela crítica, deparei-me com uma versão feminina do Denys Arcand: seus registros são muito parecidos, no que tange à exposição dos preconceitos inassumidos da 'intelligentsia' canadense francófona. A beleza de Pierre-Yves Cardinal chama muito a atenção, de modo que, em diversos momentos, colocamo-nos ao lado da protagonista: o que faríamos, no lugar dela? A diretora, que também aparece como coadjuvante, demonstra-se francamente simpática à personagem, e entremeia bem a sua comédia de costumes, ainda que a montagem acelerada incomode, por vezes: é como se ela soubesse se expressar apenas através dos jogos de 'zoom' nos planos e contraplanos. Até que percebemos a inteligência dos enquadramentos fotográficos, que metonimizam as "distâncias" emocionais entre os personagens. O reflexo dos estados de espírito da protagonista nas aulas que leciona é uma ótima sacada, bem como o uso da canção dos Scorpions. Não esperava muita coisa, mas até que curti. Rola um 'mea culpa' em vários instantes! (risos) - WPC>
Chime
3.7 2Que o Kiyoshi Kurosawa é um mestre das tensões e um gênio estilístico, não se nega mais. Porém, achei que, aqui, o exercício muito bem realizado se esvai antes que a proposta seja direcionada a um encaminhamento tramático propriamente dito: pareceu-me apenas um 'trailer', uma publicidade estendida que não deixa claro o que está sendo efetivamente vendido: autoralidade per si? Seja como for, é um trabalho muito bem interpretado, com excelente fotografia e desenho de som, momentos assustadores e perturbadores e muitas pistas falsas (o empréstimo solicitado pelo filho e a obsessão da esposa pelas latas de refrigerantes, à frente). Amei e me inspirei na paciência docente do protagonista, sobremaneira indulgente em relação aos pantins de seus alunos culinários. Até certo ponto, entretanto... Tecnicamente irrepreensível, mas enredisticamente pendente. Seria intencional? Talvez eu ame o filme numa revisão ou numa retrospectiva/maratona da carreira do cineasta, mas, neste primeiro contato, o média-metragem não funcionou tanto comigo, infelizmente! (WPC>)
A Filha do Palhaço
3.7 2Primeiro questionamento: por que o diretor, responsável por obras tão originais, em oportunidades anteriores, resolveu render-se a um filme tão convencional, formulaico e atravessado pelas piores convenções familiares? Graças aos créditos de encerramento, sabemos que ele é parente de um humorista muito famoso no Ceará, que serviu de inspiração para o protagonista. Porém, isso não é suficiente para justificar o cabedal de equívocos aqui deslanchado: durante a projeção, sento muita vergonha alheia. Fazia tempo que eu não ficava tão incomodado durante uma sessão, por causa das interpretações retraídas, artificiais... Felizmente para o meu relacionamento com o filme, notei que isso tem a ver com a diegese, já que é uma narrativa sobre as tentativas de pertencer em ambientes de aparente repulsa/expelição inicial. O personagem de Démick Lopes comete erros o tempo inteiro e segue equivocado em sua impercepção de alguns deles (o desfecho, em sua forçação de barra melodramática, é vexatório!), mas isso também tem a ver com um subtexto tramático, de maneira que o filme, em seus equívocos, assume os erros dos personagens e, tanto um como os outros merecem novas chances e o nosso apoio espectatorial. Jesuíta Barbosa aparece como mero chamariz de público, mas demora a demonstrar-se orgânico, em relação ao que ocorre ao redor dele. Amei a trilha musical, repleta de artistas alternativos, e, em meu incômodo extremo, flagrei-me pensando em minha própria vida, em minhas escolhas, em meus anseios e frustrações. E, mais uma vez, o filme é sobre tudo isso. Funciona, portanto. Principalmente quando é permitido algum respiro circunstancial, para além das cenas de pretenso impacto, ostensivamente falhas (o que ocorre na discussão da praia e no hospital é lamentável, de tão mal executado. Idem para o surgimento da mãe, em determinado momento). A sessão terminou há algumas horas, mas sigo pensando no filme, com um carinho maior que as minhas irritações. Até deu vontade de revê-lo, devidamente acompanhado. Sigo crente no diretor, ressalto. Mas realmente torço para que ele se afaste dessas narrativas mais tradicionais (nos dois sentidos do termo, incluindo o pior deles). Sigamos! (WPC>)
A Estrela Cadente
2.9 4Estranhamente, eu não conhecia esta dupla genial de realizadores - e, em meu primeiro contato tardio, fui arrebatado, fiquei apaixonado: os números de dança são magníficos, as autocitações são ótimas, a reverência a Jacques Tati, Aki Kaurismäki e Roy Andersson é evidente, e o modo como a trama se desvela é magistral, inclusive no que tange às questões políticas (vide as oportunas menções a greves, por exemplo). Amei a trilha musical (Birds on a Wire, já sou fã de vocês!) e Kaori Ito merece ser aplaudida de pé: que mulher impressionante! Filmaço, gente. Não desperdicem a oportunidade de conferi-lo: quero tirar o atraso quanto aos trabalhos prévios dos realizadores, o quanto antes! (WPC>)
Love Lies Bleeding: O Amor Sangra
3.6 124Não sabia direito o que esperar: gostei muito do título e percebi que muitos amigos tinham apreciado, de modo que já tinha o interesse suficientemente despertado. Ainda não vi o longa-metragem anterior da diretora, mas, pelo que percebi aqui, ela domina com profusão as convenções do gênero. Os admiradores de David Cronenberg e Julia Ducournau devem ter ficado muito felizes com os resultados, bem como os fãs de Nicolas Winding Refn, com quem o estilo da diretora é deveras assemelhado. Ed Harris e Jena Malone estão ótimos em papéis intencionalmente caricaturais, mas as grandes interpretações são as das duas protagonistas, tão opostas e complementares como Yin e Yang: que Kristen Stewart é uma ótima atriz, todos nós já sabemos, mas não conhecia Katy O'Brian, fiquei impressionado com a sua ótima presença em cena, com a sutileza de suas transformações (emocionais, não apenas explicitamente corporais). A trilha musical sintetizada de Clint Mansell é ótima, bem como a utilização de múltiplos tons rubros na fotografia. Causa algum estranhamento o fato de quase tudo naquela cidade ter a ver com três ou quatro personagens (neste sentido, o filme possui uma aparência obliquamente teatral similar à de KILLER JOE - MATADOR DE ALUGUEL), mas é um aspecto que não atrapalha os ótimos efeitos cinematográficos: o que ocorre naquele surpreendente e alucinógeno desfecho é acachapante. A-do-rei! (WPC>)
Na Cama com Victoria
3.0 32 Assista AgoraComo estou assistindo aos filmes desta diretora em ordem cronológica invertida, está havendo também a constatação de uma ordem decrescente de qualidade. O que não chega a ser demeritório, visto que seu domínio do roteiro com múltiplas camas e do elenco impressionam a cada novo contato. A envergadura assumidamente cômica desta obra possui um cariz auto-indulgente, o que talvez explique o porquê de ele não ter me fisgado tanto quanto os dois longas-metragens posteriores: é como se, ao explicar que beleza e inteligência são critérios que chamam a atenção do júri, a protagonista me fizesse suspeitar do meu fascínio pelas situações amorais trazidas à tona. A personagem é ótima, as situações são sempre críveis, as aparições animais são magistrais e o desfecho é conciliador, afinal, mas , no saldo geral, senti falta das pontas soltas que tornar-se-ão o grande apanágio do estilo trietiano. Incrível como, numa obra ainda curta, ela já conseguiu se consolidar autoralmente: nasceu pronta! (WPC>)
Um Dia Nossos Segredos Serão Revelados
3.2 4Há muito nas entrelinhas do roteiro: como a protagonista é uma leitora compulsiva, ela nos treina para que leiamos também. Neste sentido, faz sentido que tantos espectadores tenham notado reverberações de romances famosos, além das próprias discussões internas sobre "Os Irmãos Karamazov". Gostei de como a ambientação político-nacional reflete a pós-adolescência da personagem, mas, depois de certo momento, começou a ficar repetitiva e não mais tão interessante o ciclo de atração e repulsa entre a jovem e o vizinho mais velho de seu namorado. A fotografia perenemente alaranjada fascina, também, pelos subtextos comparativos, já que faz o trigo rimar com o crepúsculo, com os cabelos loiros da protagonista e com o papel de parede do quarto de Henner. Começar com Depeche Mode e terminar com Patti Smith foi uma ótima sacada da diretora. Mas o filme estendeu-se onde talvez nem precisasse e subestimou o potencial reflexivo das conversas familiares, das múltiplas distinções (cidade x campo, RDA X RFA, etc.) que atravessam a trama... Seja como for, possui calor, que eventualmente redunda em febre. É agradável, ajuda-nos a refazer as pazes com memórias de juventude. E estimula-nos a voltar aos clássicos da Literatura mundial! (WPC>)
Pérola
3.5 25Que o Murilo Benício é um ótimo e versátil ator, não se nega. Mas, como diretor, infelizmente, está optando pelas execuções mais equivocadas possíveis. Aqui, por exemplo, a indefinição do ritmo cômico faz com que o filme pareça um pasticho mui piorado de MINHA MÃE É UMA PEÇA - O FILME, sem o mesmo talento na composição de personagens: é tudo exageradamente caricato, insuportável de ser acompanhado. A montagem alinear é horrenda, a concepção do álter-ego do dramaturgo é péssima (que atorzinho inexpressivo!) e a pretensa homenagem à maternidade é tolhida no próprio projeto, pela maneira abjeta e oportunista com que a personagem-título trata a mãe, que sequer aparece... É um retrato cômico (mas sem graça) sobre os estereótipos de classe e sobre os apanágios egoístas e egocêntricos dessa conjuntura. Não se consegue entender adequadamente os conflitos de personagens secundários (a traição conjugal perpetrada por uma das tias, por exemplo), de tão mal desenvolvidos que estes são. E o narrador revela-se alguém progressivamente desinteressante e mui desagradável: não conheço a origem teatral desta produção, mas, por este roteiro, é difícil imaginar que ele tenha se convertido num autor tão consagrado. Esforcei-me para gostar de algo no filme, mas é tudo degringolado, histriônico, disfuncional... Uma pena! (WPC>)
Sagrada Família
3.0 4Foi o meu primeiro contato com o diretor, e já fiquei sumamente apaixonado: por mais que a sinopse direcione-nos para uma determinada trama, o que se descortina diante de nossos olhos (e, sobretudo, ouvidos) é extremamente radical, múltiplo, polifônico. A montagem de sons desta obra é uma das coisas mais geniais que existem! Vi o filme com minha mãe, que temeu ficar tonta, tamanha a quantidade de 'travellings' circulares, tão longos quanto brilhantes. Confirmando a associação do Cinema Marginal (ou melhor, pós-Novo, como bem dizia o Carlos Reichenbach) às estradas vazias, aqui, elas abundam: a migração ocorre da cidade grande para o interior, num percurso que faz completo sentido, em relação às intenções do diretor, que é mineiro. Não o conhecia: descobri esta obra-prima por conta de seu falecimento, e fiquei alucinado. Pereio está gostosíssimo como personagem maladro. Minha mãe ficou espantada com a quantidade de livros nos cômodos. Tudo aqui é genial: Maria Gladys deve ter ficado felicíssima com a menção nos ótimos e mui coloridos créditos de abertura. Um novo mundo abriu-se para mim, em pleno Brasil. Ôba! (WPC>)
Antes Que Tudo Desapareça
3.4 32Que filmaço é esse?! Como é que eu pude ficar tanto tempo sem conhecê-lo?! A cada obra do Kiyoshi que eu descubro, fico mais e mais impressionado com a maneira como ele mescla as convenções de diversos gêneros. Porém, o que ele faz aqui é ainda mais acachapante: pense num filme surpreendente, com as reviravoltas mais impensáveis... O elenco é ótimo e a direção entrega-nos seqüências longas e impressionantes (vide o que ocorre no hospital). O mote de invasão alienígena é pretexto para valiosas reflexões sobre relações humanas, incluindo uma crise marital e um contexto empregatício mui abusivo. Os efeitos visuais são magistrais, bem como a maneira esplêndida com que os "possuídos" pronunciam, de maneira intencionalmente inexpressiva, elucubrações existenciais de alto calibre. Magnífica descoberta, fui arrebatado! (WPC>)
Trama Sinistra
3.5 29Não sou muito aficcionado por gatos, de modo que apreciei de imediato o ponto de partida tramático, afinal dividido em três episódios: é incrível como os felinos estão associados ao terror, né? O segmento que intersecciona os episódios é um tanto exagerado, no que tange à exigência de verossimilhança para os relatos literários trazidos pelo personagem de Peter Cushing, mas é divertido vê-lo interagindo com Ray Milland. O primeiro episódio, mais aterrorizante efetivamente foi o meu favorito. O segundo é um interessante conto de perversão infantil. E o terceiro adere a uma perspectiva mais cômica. Cada um dos três possui o seu charme peculiar. Um passatempo divertido! (WPC>)
Mortalmente Perigosa
4.1 39 Assista AgoraRevi com minha mãe, a propósito convidativo de um debate em cineclube, e foi ótimo vê-la torcer pelos mocinhos/bandidos (leia-se: anti-heróis): por mais radicalmente anti-armamentista que minha mãe seja, em diversos momentos ela queria que os personagens matassem seus perseguidores, de tão entusiasmada que ela ficou. Há inúmeras possibilidades de interpretação freudiana para as situações do filme, com destaque para aquela abertura explícita e magistral. A voz de Peggy Cummins é sumamente sedutora: que mulher linda, como não se apaixonar imediatamente por ela? Trata-se de um filme pioneiro e mui subversivo, que aborda as questões fetichistas de maneira originalíssima e enfatizando a complementaridade requerida por determinadas ações, sobremaneira quando de ordem criminosa. A seqüência final - idílica e desoladora, ao mesmo tempo - é excelente. Em minha opinião empolgada, uma obra-prima absoluta! (WPC>)
Wish: O Poder dos Desejos
3.0 167 Assista AgoraOuvi tanta gente falando mal, que adentrei a sessão sem quase nenhuma expectativa. Mas, tanto como ocorreu em ENCANTO, fui logo atraído pelas belas canções com acento hispânico. Havia algo de promissor na narrativa, que atualizava questões tanto do Velho Testamento quanto de MILAGRE EM MILÃO, no que tange a livre-arbítrio e questões afins. Mas, de repente, tudo se perde numa narrativa insossa, sem desejo ou paixão, tão artificial que parece uma mera costura forçada para acrescentar as auto-referências a inúmeros outros longas-metragens clássicos da Disney. Será que o roteiro foi escrito com o auxílio de Inteligência Artificial? É o que parece! Tanto que a reviravolta não convence muito, além de eu ter achado o personagem do bodinho falante (com voz grave) inconveniente e destoante. Os momentos isolados de candura compensam o saldo geral entretanto: minha mãe, por exemplo, adorou! (WPC>)
Na Cama com Madonna
3.7 152Este filme marcou a minha pré-adolescência: foi a primeira vez na vida em que ouvi a palavra "orgasmo" e que apresentou-me a uma artista que, naquela época, já era completa, já podai ser considerada imortal. após o show arrebatador do último sábado, no Brasil, resolvi voltar a este documentário seminal, e percebi muitas similaridades cênicas. Os depoimentos são ótimos, bem como a demonstração das vocações maternais da cantora, que tratava a seus dançarinos como filhos. Ela não hesita em se exibir como caprichosa, mimada e um tanto infantil nalguns momentos, mas tudo isso é justificado pelas diversas falas sobre a necessidade de ser amada. As situações envolvendo os seus familiares, no show em Detroit, também explicam muito sobre ele. Idem quanto aos encontros com Kevin Costner, Pedro Almodóvar, Antonio Banderas e o relacionamento com Warren Beatty. A despeito da longa duração, é um filme muito gostoso de ser visto, principalmente quando se é fã da estrela titular. Muito bom perceber quão fiel a si mesma ela permaneceu, trinta e três anos depois que ela própria tinha ainda 33 anos. Adorei! (WPC>)
A Freira e a Tortura
3.0 17Em uma nova revisão, com debate, alguns problemas, maiores que as próprias contradições estruturais, se manifestam: o desfecho imposto por David Cardoso, por exemplo, que contradiz a lógica anterior do enfrentamento entre os personagens. No geral, entretanto, a autoralidade candeiasiana e a base teatral validam a narrativa muito forte sobre um período atroz de nossa história. O personagem masculino é bem construído em sua ojeriza e Vera Gimenez consegue se impor como freira descobrindo que amar a Deus requer prática. O uso da trilha musical, a montagem elíptica e a fotografia do próprio Candeias são agrados à parte, bem como a averiguação das obsessões bestiais do realizador, que sempre expõe como as agruras do ambiente tendem a desumanizar os indivíduos. Incômodo e problemático, mas indubitavelmente ótimo! (WPC>)
A Fraternidade é Vermelha
4.2 440 Assista AgoraVários amigos acham este o melhor da trilogia. Eu, entretanto, sempre tive uma barreira íntima em relação a ele. Na revisão, acho que entendi o porquê, em lógica de psicologia reversa, visto que vermelho é a minha cor favorita, sou extremamente cinófilo e também passo por questões envolvendo a renúncia de compromissos pessoais em razão de problemas familiares. Zbigniew Preisner comparece com um lindo bolero (executado numa passarela de moda, quem diria?) e Iréne Jacob encanta-nos a cada instante, a cada sorriso, a cada emulação profissional de tristeza... A direção e a montagem são sobremaneira joviais e a personificação de Jean-Louis Trintignant faz jus à sua fama enquanto ícone francês. O vermelho fascina, seduz... As indicações ao Oscar que o filme recebeu são merecedíssimas! Imagino o impacto desta obra para o jovem Paul Thomas Anderson, por exemplo. Lindo: na revisão, emocionei-me bastante! (WPC>)
A Igualdade é Branca
4.0 366 Assista AgoraO tom dramático muda em relação ao primeiro filme: aqui, o diretor retorna à condição polonesa, em contraste com o idílio francês, prometido via matrimônio com uma das mulheres mais lindas existentes: apaixonei-me perdidamente por Julie Delpy desde o primeiro instante. Sua personagem é cruel, entretanto: ferida em seu desejo feminino, ela é pivô de uma trama de vingança que, em muitos aspectos, soa alegórica. O tango preisneriano é belíssimo, e a amizade edificada naquela corrida na neve marcou a minha pós-adolescência! É o menos favorito da trilogia, mas, ainda assim, brilhante em diversos aspectos! (WPC>)
A Liberdade é Azul
4.1 650 Assista AgoraDepois de assistir a este filme N vezes em minha adolescência (obrigado, revista Caras!), o revi após mais de 20 anos - e foi uma experiência epifânica , tanto como são muitas das situações que ocorrem no enredo: parte-se de uma tragédia, de um evento muito doloroso, rumo à potência da reconciliação, com uma sinfonia enquanto metáfora. Juliette Binoche está em estado de graça, e a trilha musical de Zbigniew Preisner é antológica, clássica desde o momento de sua composição. Que fotografia sublime: sempre que aparecia um relance de azul, eu comemorava, eu exultava. Mas há estratagemas ainda mais complexos e sutis envolvendo cores, como aqueles apagões de hesitação, em momentos decisivos. os coadjuvantes são ótimos (até Emmanuelle Riva comparece) e as situações paralelas e/ou secundárias são igualmente contributivas para a libertação da protagonista, em sua renúncia inicial ao luto. Obra-prima absoluta: soberbo! (WPC>)
Com Minha Sogra em Paquetá
3.1 3De fato, quando Dercy Gonçalves está em cena, o filme consegue provocar o riso por conta de seus exageros. Mas o que ela faz com um cavalo e seu condutor, no terço final, é indefensável: minha mãe ficou irritadíssima, inclusive porque ela sequer paga ao figurante, que fica inerte enquanto as situações previsíveis de resolução acontecem. O casal jovem é canastrão e as crianças são graciosas. E, por mais que as apresentações da escola de samba soem um tanto arrítmicas, no modo como invadem a narrativa e se demoram - desencadeando um desfecho anticlimático para o filme -, elas comprovam o zelo do diretor em relação à trilha musical. É uma produção que, em suas convenções chanchadescas tardias, envelheceu mal. Mas que, ainda assim, diverte e faz com que prestemos atenção ao seu realizador, infelizmente pouco valorizado pelos enciclopedistas cinéfilos. De minha parte, estou esforçando-me para corrigir isso! (WPC>)
Deixa, Amorzinho... Deixa
2.5 4Apesar do título suspeitoso e execrável, o file é bem mais elaborado do que a publicidade fez parecer: o enredo, em sua brasilização de O CÉU PODE ESPERAR e afins, proporciona boas interpretações ao elenco envolvido e um aproveitamento elaborado de personagens lúbricos históricos. Sandra Barsotti, colaboradora habitual do diretor, está contida, enquanto Maria Lúcia Dahl arrebenta como uma feminista assumida e ostensiva. Quem acreditaria no Ney Latorraca enquanto conquistador heterossexual? (risos) Grande Otelo, apenas por aparecer, já nos provoca risos legítimos. E o cuidado do cineasta com a trilha musical (ótimo o tema próprio, inclusive) é mui laudatória. As seqüências que mostram a infância dos gêmeos evidencia um freudianismo extraordinário. Não gostei tanto quanto poderia gostar, mas achei o projeto inteligente e merecedor de novas chances. De uma hora para outra, estou recomendando para todo mundo um diretor que eu não conhecia - e que, infelizmente, partiu muito cedo, tendo realizado pouquíssimos filmes! (WPC>)
O Marido Virgem
2.6 4Surpreendentemente, apesar de eu ter pesquisado as pornochanchadas em meu Mestrado, eu não conhecia o Saul Lachtermacher até um dia desses. E, sem ter visto os filmes, cri que ele fosse medíocre por causa de seus títulos super machistas. Erro meu! A despeito do ponto de partida machista, inevitavelmente, o roteiro torna o protagonista legitimamente defensável (por ele não ser ciumento, por exemplo). O modo como os adultérios são justificados (mediante concessão psicanalítica) é interessante e a revelação da "maldição" impotente é hábil e divertido. Minha mãe gargalhou em diversas cenas e eu fiquei realmente espantado com a guinada ideológica que o filme dá: a partir da mais repetitiva das situações, faz com que percebamos que há um problema nisso (vide as conversas do ciclo feminino, desde a despedida de solteiro). Quem diria? (WPC>)
Explota Explota
3.0 4 Assista AgoraFiquei muito interessado por este filme desde que soube de seu lançamento: amo musicais e sou apaixonado por música brega. E acho a Raffaella Carrà belíssima, obviamente. Como tal, é claro que eu interessar-me-ia por um a homenagem a ela. E, de fato, curti o começo efusivo e o modo como, gradualmente, em meio ao desenvolvimento da comédia romântica, passa-se a abordar a questão da censura durante uma ditadura militar. O que poderia alavancar o filme serviu para atrapalhá-lo, no sentido de que, no terço final, o roteiro rende-se a uma indulgência excessiva em relação a personagens moralistas e sumamente vilanescos, que são recompensados por terem feito o pior, uma pena. Tantos finais diferentes (e melhores) foram anunciados... Por motivos óbvios, lembramos de MMA MIA! - O FILME, mas o alinhavamento cancional é superior aqui, além de as canções serem mais respeitadas. Vi com minha mãe, foi divertido, ao menos! (WPC>)
O País da Pornochanchada
3.0 3Apesar do título amplo e diagnosticador, a reflexão nacional possui um viés íntimo e familiar: o que interessa ao diretor não é realizar um tratado sobre a pornochanchada, como parecia, mas uma abordagem pessoal, semi-ensaística, acerca de sua relação com os filmes do pai diretor, Saul Lachtermacher, que eu bizarramente não conhecia, apesar de ser atraído pelo tema de suas obras. Já descobri que, dentre os quatro longas-metragens deste diretor, ao menos três estão atualmente disponíveis, na internet. Compensarei esse atraso urgentemente, enquanto aguardo novas sessões do derradeiro filme, considerado perdido por muito tempo. Pessoalmente, até gostei da narração do Adolfo, mas incomodei-me com o excesso de de imagens de três filmes, exageradamente mostrados, o que atrapalha o prazer de quem ainda não os viu ou soa redundante para quem já os conhece. Achei oportuno que a consciência do machismo estrutural naqueles enredos fosse reconhecida e criticada , mas não rejeitada por completo, visto que, a despeito disso, alguns dos filmes maculados por esta pecha ignóbil têm algo de interessante em seu bojo. É o que verificarei a partir da filmografia do Saul... Voltarei a este assunto: aguardem-me! (WPC>)
Verissimo
3.1 3Numa oportunidade anterior, o diretor deste documentário adaptou muito bem uma obra do escritor: acho O CLUBE DOS ANJOS um filme interessantíssimo. Mas não entendi bem o recorte temporal escolhido para este documentário camerístico, intimista quanto o autor se declara: filmado em 2016, às véspera do aniversário de 80 anos do personagem-título, há uma contagem repressiva para a data-chave. Mas, exceto por esta relevante comemoração, por que escolher este período? Não há justificativa para tal e, apesar do ritmo lento - que, repito, combina com as declarações de introspeção do escritor - pouco é mostrado, não se sabe muita coisa sobre ele, exceto que ele é amado pela família e que movimenta-se com dificuldade, por conta da idade avançada. E daí? Temos um importantíssimo escritor em cena, e o diretor realiza um elogio à monogamia bem sucedida? Tem seus méritos, claro, mas decepciona bastante em relação ao biografado. (WPC>)
A Natureza do Amor
3.4 3 Assista AgoraNão conhecia esta diretora e, num filme quiçá hiperestimado pela crítica, deparei-me com uma versão feminina do Denys Arcand: seus registros são muito parecidos, no que tange à exposição dos preconceitos inassumidos da 'intelligentsia' canadense francófona. A beleza de Pierre-Yves Cardinal chama muito a atenção, de modo que, em diversos momentos, colocamo-nos ao lado da protagonista: o que faríamos, no lugar dela? A diretora, que também aparece como coadjuvante, demonstra-se francamente simpática à personagem, e entremeia bem a sua comédia de costumes, ainda que a montagem acelerada incomode, por vezes: é como se ela soubesse se expressar apenas através dos jogos de 'zoom' nos planos e contraplanos. Até que percebemos a inteligência dos enquadramentos fotográficos, que metonimizam as "distâncias" emocionais entre os personagens. O reflexo dos estados de espírito da protagonista nas aulas que leciona é uma ótima sacada, bem como o uso da canção dos Scorpions. Não esperava muita coisa, mas até que curti. Rola um 'mea culpa' em vários instantes! (risos) - WPC>