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Últimas opiniões enviadas

  • Thiago Rossoni

    O poder imagético King Kong possui é gigantesco e perpassa por várias camadas alegóricas, sendo atribuído, adjetivamente, à ferocidade e a força física e simbólica do famoso gorila imortalizado no filme homônimo de 1933, de Merian C. Cooper e Ernest B. Schoedsack. E é através dessa força imagética que Camilo Cavalcante, que parte já do próprio título do filme, canaliza esse poder e feracidade e constrói por intermédio de seu protagonista, um bucólico filme de jornada interior. “King Kong en Asunción” é um road movie doloroso, que convida o espectador a testemunhar feridas que nunca cicatrizam.

    Na trama de “King Kong en Asunción” acompanhamos o já velho matador de aluguel (Andrade Júnior), que após realizar um último serviço em terras bolivianas parte para o Paraguai para encontrar com sua filha, na qual nunca conhecera. No caminho ele reencontra velhos amigos e se depara com medos interiores e violentas lembranças de seu passado. Em busca de se encontrar num mundo familiar, porém distante emocionalmente, o Matador se mistura meio a um povo sofrido, que carrega o pesado fardo do apagamento histórico e social.

    Partindo de uma região desértica da Bolívia, o filme de Camilo vai construindo, lentamente, o caráter geográfico e apático dos locais em que o protagonista percorre. O caminhar e as andanças do protagonista absorvem completamente o sentido de uma viagem solitária e angustiante, fato que o longa realiza com bastante consciência, abstraindo o tempo e praticamente o congelando. Não é só a viagem que é arrastada, mas as relações também se materializam em uma outra lógica. Desprendida de um mundo supostamente afetuoso e com falsas esperanças, os personagens parecem viver num eterno ciclo de existência onde o presente é o que mais importa. Embora o protagonista possua um objetivo tangível, o futuro nunca parece ser algo efetivo e concreto, os desencontros do agora possuem mais forma e mais textura do que o porvir.

    Como dito anteriormente, a geografia é força motriz na composição narrativa do filme. É ela que vai traduzir, em vários momentos, a grandeza dimensional dos lugares, evidenciando, consequentemente, a sua força híbrida passivo-agressiva, ao confrontar as pequenezes das personagens. É à partir de longos planos gerais que a obra insere a desafeição do deserto, da cidade e do centro urbano. Em contrapartida, são os primeiríssimos planos que vão investigar a trajetória do protagonista. Se nesses planos abertos o personagem se transforma em uma pessoa quase insignificante, é por meio dos planos fechados que o passado vem à tona, como uma espécie de cine-rosto, onde as marcas, as rugas e as expressões do tempo esculpem uma trajetória amarga e conflituosa. O cuidado, dentre essas expressões estilísticas citadas, é crucial para que o Matador chame o filme para si. E é nesse encontro de forças visuais que Andrade Júnior externaliza todo a sua potência em cena, numa atuação corporal vigorosa traduzida em sentimentos.

    O Matador é esse ser, praticamente um arquétipo, de um sujeito inserido numa sociedade violenta, onde se desumaniza, reprimindo sentimentos e gerando assim mais violência. E é então, nessa clara apatia contraditória do protagonista, que ele se vê num obscuro mundo imperceptível de mercadorias fetichizadas. O dinheiro adquirido através do trabalho realizado permite ao Matador que compre um carro, bebidas, cigarros, que se hospede em luxosos hotéis, mas não permite que se liberte da violência de seu passado e, sendo assim, de suas angústias. Angústias essas que não são verbalizadas, mas que são externalizadas de forma física e sensorial através de pesadelos.

    A não verbalização de um passado tão longínquo, porém tão pulsante, é quebrada na narrativa através de uma narração em guarani, interpretada por Ana Ivanova, à partir de um belíssimo texto da escritora Natália Borges Polesso, que rompe com as fronteiras visíveis e invisíveis, corpóreas e espirituais. Os saltos na temporalidade narrativa fazem com que a narração em off seja mais do que um guia, mas também um ser onipresente, que por meio de uma sabedoria ancestral, constrói e desconstrói caminhos trágicos para os personagens que vem e vão ao longo do filme. O saber onírico da narração pode parecer, por tantas vezes, tentar redimir o protagonista, mas não é esse o seu propósito, deixando assim que o personagem siga vagando pelos lugares, alheio ao seu próprio destino.

    É com seus encontros e desencontros que o Matador percorre um árduo caminho de auto redenção e, por fim, como já demonstrava simbolicamente ao longo de toda a sua trajetória, materializando o King Kong na cena final. O não-lugar é latente, a latinoamericanidade é clara e é, só assim, na figura de um ser mitológico, que a redenção parece tomar forma. “King Kong en Asunción” é encontro, é o caminho penoso da reconfiguração de um violento passado, é a vultosa aglomeração de pessoas-personagem que possuem identidade, tradição e história. É sorte, destino, sina, castigo e, finalmente, o desejo da liberdade almejada.

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  • Thiago Rossoni

    Eu tô o próprio Mojica naquela foto segurando um papel escrito "eu acesso o making off"! Que alegria foi ver este filme em sua totalidade, sem os brutos cortes e com suas cores maravilhosas. A cópia restaurada era tudo o que os fãs do cinema brasileiro esperavam.

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  • Thiago Rossoni

    Impressionante como Mekas monta e desmonta o filme na nossa frente. Ele monta, claramente, à medida que escolhe trechos e cola em outros, criando assim esse mosaico do cotidiano. Mas ele também o desmonta quando intervém como narrador, praticamente desnudando o processo de feitura do filme, que é extremaente pessoal, artesanal e caseiro.

    Eduardo Coutinho costumava dizer que a memória é montada, praticamente inventada, e aqui a gente consegue exergar a materialização disso. O filme parte de uma memória que se constrói na imagem como matéria prima, e é neste processo literal de montagem que as imagens vão ganhando um significado que existe somente quanto obra audiovisual.

    Por fim, é um filme sobre nada, realmente. Como também é um filme político. Mas, acima de todas as coisas, é lindo, porque esse foi o recorte da vida esscolhido. É porque as imagens de Mekas possuem lampejos de beleza.

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